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  • Foto do escritorDa Redação

Nilton Santos | Vida que segue...



Apesar da retração e recolhimento a que todos estamos expostos, sabe-se lá até quando, por causa de uma “gripezinha”, a vida segue seu ritmo frenético. No Brasil a impressão é de que, mesmo que a preocupação com a sobrevivência esteja primeiro plano, os fatos vêm se sucedendo em grande profusão.


Em uma semana, o antes todo poderoso, quase unanimidade nacional, Sérgio Moro se demitiu do Ministério da Justiça. Saiu atirando. Acusou o presidente de indevida e ilegal tentativa de usar politicamente a Polícia Federal, segundo alguns, para evitar o pior para si próprio e filhos. Por seu lado, Bolsonaro, pregando contra a democracia que o possibilitou ser presidente, sonha com o autogolpe onde ele e os militares passariam a mandar e desmandar sem pedir licença.

Perdemos, por doenças do corpo e da alma, escritores, poetas e atores. Os ilustres que nos deixaram merecem toda a minha atenção, sentimento de respeito e vazio pelo valor que os devotava. Contudo, a morte de Flávio Migliaccio foi a mais emblemática em razão do que nos deixou em sua última e dolorosa manifestação. Um brado de desespero diante da fatalidade da vida, onde quem envelhece muitas das vezes morre em vida, de abandono.


No início do ano a Rede Globo não renovou vários contratos, o que levou o ator Stênio Garcia a postar um vídeo onde desnudou o seu desespero diante da realidade em que se encontra: hoje um homem velho e desempregado que, com o que recebe de aposentadoria, não paga sequer os remédios que necessita para ficar vivo. Pelo teor das poucas linhas da carta de demissão da vida escrita por Migliaccio, se pode imaginar o grau de desilusão que trazia em sua alma no apagar das luzes da ribalta de onde nos presenteou com atuações memoráveis.


É, a vida é dura, principalmente para quem o sistema já não vê nenhum interesse e, não mais do que de repente, acontece. Evoluímos à condição de estorvo; como se naquele corpo vergado pelos anos já não more mais uma alma. Portanto, nada mais "normal" do que rebaixá-lo à condição de coisa a ser descartada, reles entulho, bagaço sem suco. Na infância somos doces, na juventude sonhadores, na vida adulta competidores, muitas das vezes extremamente cruéis. Afinal precisamos ganhar o pão nosso de cada dia. Na velhice – se chegarmos lá - seremos nada.


E assim vamos cumprindo a saga de que o homem nasce, cresce, sofre e morre. Que lástima o que estamos fazendo com nós mesmos.


Nilton Santos


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